Batalha e a colonização do Piauí

Estudar a história de Batalha significa, além de resgatar e contribuir para o fortalecimento da identidade de um povo, abrir novos leques na interpretação da polêmica tese da colonização do território Piauiense. Antes de mais nada, é preciso esclarecer que não se trata de contestar ou refutar teses já defendidas por consagrados historiadores, mas somar a essas idéias novos pontos de vista que certamente contribuirão para reforçar tudo que já foi pesquisado.

O processo ocupacional das terras do vale do Longá e do Piracuruca, assim como de todo o norte do Piauí, delimitado entre o rio Poty e o oceano atlântico, não obedeceu a mesma lógica de ocupação do restante do território que em 1758 se tornaria a capitania de São José do Piauí,com as mesmas delimitações geográficas do atual estado.

Confirmações a esta tese estão em três fatos: primeiro é preciso considerar que antes da criação da Capitania (1758) o norte do Piauí era um domínio pertencente ao então estado do Maranhão e Grão Pará, delimitação política feita por Portugal após o acordo da União Ibérica com a coroa Espanhola que permitiu, sob a coordenação de missões religiosas e guerreiras, ocupar todo o território que ia desde o atual Ceará até o Amazonas quebrando as fronteiras do tratado de tordesilhas. A forte atuação das missões catequéticas nessa região é unanimidade entre os pesquisadores que trabalham essa temática e no território do norte do Piauí essas evidências estão na existência de uma missão com a de São Francisco Xavier (Ibiapaba) que deixou como marca a forte religiosidade característica do povo Batalhense e a simbólica arquitetura de construções como a imponente igreja de N. S. do Carmo de Piracuruca.

Um segundo fator que reforça este pensamento é a própria “Descrição do sertão do Piauí” de Padre Miguel de Carvalho, documento referencial para as pesquisas acerca da ocupação do território Piauiense e no qual não consta a descrição de importantes sesmarias como o sítio Vitória no vale do rio Longá, cujo dono foi o patriarca das principais famílias que formaram a sociedade Batalhense: Antonio Carvalho de Almeida. No citado documento, Padre Miguel de Carvalho deixa claro que existem fazendas já instaladas na “terra dos alongases” e cujo domínio são as missões da ibiapaba, diferentemente do centro sul do Piauí, descrito no documento, que era vinculado à freguesia de N. S. da Conceição do Cabrobó de Pernambuco. Nessa perspectiva não era de se esperar a citação de uma fazenda do vale do Longá ou do Piracuruca no referido documento, já que se tratava de um trabalho feito dentro dos domínios da capitania de Pernambuco, que no Piauí incluía apenas o vale dos rios Canindé, Piauí e seus tributários. No entanto, o próprio Padre Miguel, em suas citações não nega a já existência de fazendas e moradores na região do Longá em meados do século XVIII.

Em terceiro lugar é preciso considerar a origem dos povoadores que chegaram à região de Batalha. Os ocupantes do centro-sul do Piauí vieram para as terras do interior do Brasil na condição de bandeirantes (como Jorge Velho, Mafrense e os Dias D’ávila) ou populações que migraram da zona da mata por razões que vão desde a crise da economia açucareira, a fuga do trabalho escravo, a aposta em tentar a vida na desconhecida hinterlândia brasileira e a própria lei estabelecida pelo governo geral do Brasil que estimulava as entradas e bandeiras e empurrava os rebanhos de gado e as pessoas para longe da costa litorânea. Já o norte Piauiense, embora tenha sido ocupado mais tarde que o centro-sul, a natureza do processo ocupacional obedeceu outros critérios: As famílias que vieram para esta região (a maioria genuinamente Portuguesas), já vieram sabendo o que iam encontrar, com propósitos definidos e caminhos já demarcados pelas missões catequéticas que desde o século XVII trilhavam a região e por capitães-de-mato como Bernardo Carvalho de Aguiar, cuja ação “desbravadora” completou o ciclo de extermínio das nações nativas abrindo definitivamente as possibilidades de instalação de famílias na região de Batalha. Antonio Carvalho de Almeida, por exemplo, é um Português que se instala no vale do Longá já com família constituída e quando chega a estas terras, a “Batalha” com o nativo já tem acontecido. A ação do fazendeiro Português será a de constituir laços familiares, políticos e econômicos que, décadas mais tarde, contribuirão para a formação do núcleo de poder Batalhense e de outras cidades do vale do Longá. Personalidades como José Amaro Machado e José de Miranda chegam às terras de Batalha por intermédio de Antonio Carvalho de Almeida, com casamento constituído e, naturalmente, perpetuando o domínio de um grupo que será articulador da emancipação política Batalhense em 1855.

Essas idéias, portanto, não negam qualquer pensamento anterior sobre a tese da ocupação do interior Piauiense, mas acrescentam considerações que só reforçam o que diversos pesquisadores já confirmaram, pretendendo, exclusivamente, contribuir para o engrandecimento do povo de Batalha, que também é Piauiense com muito orgulho.

Cleiton Amaral Rodrigues
Batalhense, Professor, Pesquisador e Cerimonialista